segunda-feira, 25 de abril de 2011

Gaia - Capítulo 13

Aos poucos Draco recobrava a consciência. Não tinha força sequer para abrir os olhos, mas em meio à escuridão podia sentir que seus braços estavam sendo segurados e suas pernas arrastavam pelo chão. Usando toda a força de vontade que possuía, abriu um pouco as pálpebras, enxergando o chão branco, que passava logo abaixo de seu rosto. Ele tentou virar o pescoço e olhar para os lados, mas sentia a cabeça pesada. Duas vozes conversavam bem próximas, e o assuriano deduziu que eram das pessoas que o estavam carregando.

- Que azar desse cara aqui, não é?
- Pois é. Encontrar com o coronel Van logo depois de ter matado o esquadrão inteiro? Esse cara tem sorte de ainda estar vivo. Tenho certeza que se o coronel não estivesse de bom humor porque ia matar uns assurianos, tinha matado ele na hora!
Foi então que uma terceira voz entrou na conversa, e Draco percebeu que havia o barulho dos passos de mais algumas pessoas caminhando.
- É melhor vocês apertarem o passo. O coronel disse que esse cara era perigoso, e que ele devia estar na cela antes de acordar.
Com os sentidos inebriados, não era possível saber quantas pessoas estavam andando naquele grupo, mas o volume de passos era enorme.
- Pelo menos dez... - Draco deixou escapar baixando, pensando estar apenas recitando essas palavras em seu pensamento. Assim que percebeu o que havia feito, ficou espantado.
- Droga... Não consigo pensar direito...
A voz era fraca, e praticamente ininteligível.
- Ei, esperem um pouco. - disse um dos soldados que arrastavam Draco. - Acho que escutei ele falar alguma coisa. Largue ele.
Os dois braços do assuriano foram soltos, e ele caiu estirado, batendo o rosto contra o piso.
- Virem ele, quero ver o rosto.
De forma bruta, teve o corpo virado, deixando a barriga virada para cima. Um dos bálmares, que estava mais atrás do grupo se aproximou. De um bolso na armadura ele tirou um pequeno cilindro negro, que começou a emitir um fino feixe de luz depois de ter um botão na sua extensão pressionado.
- Vamos ver, Vamos ver. - dizia ele enquanto se ajoelhava ao lado de Draco e com os dedos abria as pupilas do rapaz.
“O que? Onde está meu elmo? O chão está frio, tocando a pele das minhas costas... ah, já consigo pensar de forma mais clara... Mas ainda não consigo me mexer”
Estava sem armadura, os pés estavam frios, a parte de cima do corpo completamente nua. Mesmo sem conseguir se mexer, sentia uma dor enorme por todo o corpo, como se todos os seus músculos tivessem sido esmagados, um a um, por um martelo.
O bálmare direcionou o feixe de luz contra o olho aberto do rapaz. Imediatamente a pupila se dilatou e o olhar passou a acompanhar a lanterna à medida em que era mexida.
- Ele está recobrando a consciência. Vou aplicar mais uma dose do soro paralizante.
- Espere.
Lentamente Draco levantou a cabeça, e ainda deitado no chão olhou para quem tinha feito a objeção.
- Vamos aproveitar que esse merdinha está acordado e mostrar a ele o que vai acontecer enquanto estiver preso aqui, dentro do Gnios.
Quem falava era um capitão, que à frente da tropa de dez homens estava parado, com suas faixas azuis da armadura refletindo a luz do local.
- Por mim tudo bem, acho que esse cara merece. - respondeu o médico - Mas tentem se controlar, não quero ter trabalho demais quando for curar ele depois. E além disso, se ele morrer, acho que vamos ter problemas. O comandante deve querer fazer um interrogatório.

A expectativa do que os bálmares pretendiam fazer com ele causou um surto de adrenalina em Draco, acelerando o coração e molhando levemente a pele com suor. Queria se mexer, queria lutar, ele queria acabar com os inimigos, mas o corpo não obedecia. Podia sentir o sangue esquentando tudo debaixo da pele, no entanto, por mais que tentasse, só conseguia mexer os dedos das mãos.

O primeiro chute atingiu o rosto. O impacto atingiu o nariz e sangue manchou o chão. Draco se encolheu com a dor. Queria tocar a parte machucada, mas não conseguia.
- Hahahahaha, olha só para ele, tentando tocar o rosto com as mãos, mesmo estando sob o efeito do soro paralisante. Continuem chutando. Enquanto não desmaiar, vai continuar sentindo dor.
Uma pisada nas costelas. A bota pesada, adicionada à força do bálmare fizeram os ossos do lado direito envergarem por um momento. Um outro soldado usou a coronha do fuzil para acertar o rosto do assuriano, que continuou apanhando por mais alguns minutos, sentindo a dor pecorrer o corpo e uma pontada como uma faca penetrando a carne cada vez que lhe acertavam do tórax.
- Huf,huf, estou cansado de bater nesse desgraçado.
- Eu também. Não achava que ele ia aguentar tanto, já fazem uns cinco minutos que batemos nele.
- Foi uma boa forma de aliviar o estresse. Vamos levar ele para a cela.
- Esperem. - interveio o capitão. - Doutor, examine o prisioneiro, só para garantir que ele não corre risco de vida. - disse ele se dirigindo ao médico.
- Tudo bem.
O médico se abaixou. Calmamente examinou Draco, apalpando as partes que haviam sido atingidas, e observando os cortes e olhos.
- Ele me parece estar razoavelmente bem. Tem algumas costelas quebradas, mas isso não vai matá-lo agora. Estranho, ele é resistente demais. Qualquer um que eu conheço teria ficado muito pior depois dessa surra. Vamos levá-lo para a enfermaria.
- Tudo bem. Assim que for tratado, vamos levá-lo para a cela.
O médico tirou uma pistola para aplicação de injeções e uma ampola de dentro de um bolso. Conectou os dois, e aplicou numa veia do braço de Draco. Uma sensação de queimação subiu pelo local e se espalhou pelo corpo, logo não conseguia sequer mover os olhos. Dois bálmares o seguraram pelos braços, e começaram a caminhar o arrastando pelos corredores.

*********************

A ponte de comando do Gnios era uma sala acinzentada, de onde vários oficiais comandavam as principais atividades da nave através de seus monitores, enquanto sentados em suas cadeiras, não precisavam fazer nenhum esforço. Um grande monitor no final dela fornecia informações gerais acerca do estado da nave, suprimentos, combustível, alarmes soados por algum motivo, entre outros. O comandante estava sentado em sua cadeira, numa parte elevada no centro da sala quando ouviu o som da porta automática abrindo atrás de si. Ele girou a cadeira em seu eixo, e um homem usando uma armadura bálmare com uma linha vermelha no peito e braços entrou na sala. O homem se aproximou do comandante, que usava uma armadura semelhante, exceto que estava sem elmo, e possuía uma linha roxa nos braços, e fez uma reverência.
- Ah, coronel Van. Ouvi pelo comunicador que capturou um homem que matou seu pelotão. Me diga, foi por isso que você veio aqui?
- Em parte. General, acredito que o homem seja um assuriano que aproveitou o tumulto da batalha para invadir o Gnios. Provavelmente não estava com o navio assuriano, mas a identidade dele ainda é desconhecida. Vou providenciar para que ele fale tudo que sabe. Gostaria de pedir ao senhor que não permitisse que nenhum outro oficial se aproximasse dele sem meu consentimento.
- Por mim, tudo bem. Mesmo assim não acho que esse seja um assunto importante o suficiente para você ter que vir me falar pessoalmente. Me diga, o que foi?
- Acredito que o homem capturado seja um nobre, a habildade dele era singular.
- Sobrevivente ao ataque à casa dos Bernstein?
- Acho difícil. Nosso contato nos informou que os homens da família Bernstein lutam usando armaduras completas e espadas muito grandes. O capturado usava uma espada normal, e apenas isso. Se ele possuísse uma armadura completa, não precisaria ter se disfarçado, podia ter aberto caminho à força. Pelo que o informante nos disse, Alexander Von Bernstein seria capaz de nos impedir se nos encontrasse, e que por isso, não devíamos subestimar o filho dele. Minha opinião, é que o capturado é fraco demais para ser filho de Alexander.
- Fraco... É verdade. Você disse que ele caiu com apenas um golpe na parte de trás do pescoço. A captura de dois nobres ao invés de um... esse invasor e a mulher que estava com os bernstein. Nossa posição vai ficar ainda melhor aos olhos do rei.
Um chiado veio de um dos monitores. O capitão que estava conduzindo Draco até a enfermaria apareceu. De trás do elmo a voz passou pelo comunicador, saiu por uma caixa de som e se espalhou pela ponte de comando.
- Ponte de comando, na escuta?
- Sim, capitão Alfredo. - respondeu o oficial que estava sentado próximo à tela. - O que você tem a dizer?
- Houve uma mudança nos planos, e agora meu esquadrão está levando o capturado para a enfermaria. O efeito do soro paralizante passou mais cedo do que esperávamos, ele tentou escapar, e acabamos tendo que combatê-lo.
O general apertou um botão em sua cadeira, e uma tela holográfica apareceu em sua frente, mostrando o mesmo que o monitor do oficial de comunicação da ponte de comando.
- Capitão Alfredo, aqui é o general Marks. Houve alguma baixa no seu grupo?
- Não senhor. Apenas alguns machucados pequenos como luxações ou coisas do tipo.
- Entendo. Qual o estado do prisioneiro?
- Apenas alguns ferimentos leves.
- Ótimo. Assim que ele for tratado, o levem para a cela.
- Sim, senhor. Capitão Alfredo desligando.
A tela holográfica desapareceu, e o monitor do oficial de comunicação voltou a mostrar vários números contendo o canal de acesso à vários capitães.
- O que acha disso, Van? - disse o general virando mais uma vez a cadeira em direção ao coronel, que girou silenciosa em torno de seu próprio eixo.
- General, sozinho o homem acabou com um esquadrão inteiro. Se o soro paralizante tivesse mesmo perdido o efeito, pelo menos um ou dois soldados teriam morrido. O que deve ter acontecido, foi que o capturado acordou, ainda sob o efeito do soro, e o esquadrão do capitão Alfredo quis dar uma lição no bálmare que traiu sua nação e matou seus companheiros. Ele não deve sequer desconfiar que o capturado provavelmente é assuriano.
- Nesse caso, não faz mal. Não importa se o capturado apanhar ou não, o destino dele será o mesmo.

****************

O grupo de soldados de armadura entrou pela porta automática da enfermaria com dois deles puxando os braços de Draco, enquanto seu corpo arrastava no chão. Assim como o resto da nave, ela era toda branca, e possuía várias camas. Muitas delas estavam ocupadas por bálmares usando apenas algum pedaço de suas armaduras, que no momento se recuperavam da batalha contra o navio de guerra assuriano.

Os dois soldados largaram no chão o momentaneamente paralizado Draco. Um deles o segurou pelas pernas, enquanto o outro ficava com a parte de cima do tronco, e com um esforço só, o transferiram do piso para a cama. A sensação de passar para uma cama quentinha após ter sido arrastado pela superfície gelada foi um tanto reconfortante. A vontade era que pudesse permanecer ali para sempre, se esquecer da dor, do sofrimento e armagura que passou, e do muito pelo qual ainda teria que passar. O soro paralizante não permitia que seus músculos se mexessem, mas se tivesse sido permitido, Draco teria sorrido.
- Ei, enfermeiros! Ajudem o doutor aqui a cuidar desse paciente. Ele precisa ficar bom o mais rápido possível, assim ele é transferido para a cela, e o meu esquadrão pode ir dormir. - disse o capitão Alfredo enquanto apontava para o médico com o polegar, e depois indicava Draco, deitado na cama.
- Já estou indo! - gritou um enfermeiro que estava ao fundo, remexendo nas bandagens da prateleira de um armário.

O enfermeiro se aproximou e começou a ajudar o médico nos procedimentos, tratando cortes e hematomas, até que finalmente, depois de longos minutos, terminaram.
- Fizemos o melhor para um tratamento de emergência - começou o médico - tratamos o que podia ser tratado, mas as costelas quebradas teriam que ser arrumadas na ala de intervenção, que provavelmente deve estar lotada com soldados feridos gravemente.
- Está certo. Vamos jogar ele em alguma cela.

Dessa vez os soldados colocaram Draco em uma maca, para não estragar os cuidados do médico e do enfermeiro, e o levaram até a ala prisional. Era um local escurecido, todo em preto, contrastando com a brancura do resto da nave. Um soldado numa cabine, por trás de um vidro blindado puxou uma alavanca, abrindo o portão que dava acesso da antesala, saída do elevador, para a sala dos guardas. As rodinhas da maca fazinham um ruído chato enquanto ela era empurrada por um bálmare. Draco escutou uma voz baixa de mulher, como um choro, enquanto passava pelos guardas, mas não teve a chance de olhar, pois os músculos ainda estavam paralizados. Um outro guarda em uma cabine fez o mesmo que o anterior e abriu o acesso ao corredor das celas. De lá ele abriu a porta semi-automática de uma das celas. O grupo entrou nela, despejou o assuriano em uma cama e saiu. Cansado, Draco não conseguia pensar em nada. A dor não permitia que ele respirasse direito, e não conseguia se mover, a agonia o dominava, até que o sono o venceu, e depois do que pareceram horas deitado,  adormeceu.
“Como vou escapar dessa?”

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